Eu bem que tento. Juro. Todavia há ambientes, nos quais eu me sinto, na maioria das vezes, um peixe fora d’ água: estrebuchando, pulando a cegas aos pés da morte iminente. Porque, caso não me retirem logo do local o ar acaba e meu peito sufoca diante tanta dor. É, é assim e sem superlatividade, antes que digam que eu sou exagerada. Mas de fato existem sentimentos hiperbólicos habitando meu corpo e correndo na minha corrente sanguínea, contudo são eles que dão propulsão a minha coragem: escrever o que penso/sinto, sem amarras editoriais ou pré-conceitos morais. Talvez todas as minhas dúvidas sejam hiperbólicas e se assim for, viva Descartes! #duvidahiperbolica
Um local que me remete a sensação descrita acima é o salão de beleza. Tudo bem, eu sei. Fiz um acordo comigo mesma para tentar ser mais tolerante, para cuidar mais da minha aparência física. Eu sei. E tô tentando, mas confesso, não é fácil. Voilá:
Os papos >>>>> Geralmente, quando eu chego ao salão, mesmo com horário marcado, tenho que esperar para ser atendida. Há uma sala de espera com sofá, revistas e muitas pessoas – na sua maioria: mulheres -. Retratarei alguns diálogos que presenciei:
- Ai, meu marido, disse que não gosta do meu cabelo loiro.
- Sério. Por quê?
-Ele diz que pareço mulheres de vila.
Ao ouvir isso meu coração começou a disparar, minhas mãos a suarem e o estômago a enjoar. Duas mulheres tão preconceituosas assim causam danos irreversíveis ao meu corpo. Segurei minha boca, porque a minha vontade era dizer para ambas. Ei! Eu sou mulher de vila, qual o problema? Mas respirei fundo e continuei a ler meu livro, o qual me fazia sentir-me mais uma estranha no ninho, pois as leituras eram só de revista caras e contigo. Como se mulher só se interessasse pela cultura da futilidade. Isso já me estressa. Mas...Não parou por ai.
-A minha filha está com 8 anos. É uma graça. Educada. Já me ajuda no serviço doméstico.
- Que belezinha! Dará uma ótima esposa.
- Sempre brinco com ela que gostaria de ter uma filha muito linda ou muito inteligente. Linda para ter um bom casamento.
Por favor, alguém chama a polícia para a mãe acima. Olhe! Penso que o ela está fazendo com a filha, seja mais que um caso de policia. #gradicida Também senti vontade de voar no pescoço da muié, mas me contive. Nota: eu odeio psicanálise, mas me rendo ao Freud: Uma mãe pode acabar com a vida de um filho. #fato Seguimos...
-Ai, vou para praia com meu marido.
-Sério? Quando?
- Semana que vem. Vamos tentar reatar o casamento.
-Que bom!
-É , eu não quero me separar, construímos muitas coisas juntos. Não deixarei para que ele dê para uma vagabunda qualquer.
Duas observações. Como resgatar o que está acabado. Senti pena é do marido dela. #fato Uma vagabunda qualquer é melhor que esta senhora que é uma prostituta da sociedade/moral e dos bons costumes. #ficaadica
- Gasto todo meu salário no salão, com roupas, só comigo e com mais ninguém. O meu marido que paga as contas de casa. Afinal, marido é para isso.
A outra ri e diz:
-Verdade. Precisamos nos valorizar.
Alguém, por favor, chame o Raul Seixas. “Pare o mundo que eu quero descer” #TocaRaul Alguém ensine para essas senhoras que a ação:valorizar é o contrário do que elas disseram. #gradicidaaoquadrado #questaosemantica
- Minha empregada é tão burra.
-Falo com ela é não entende.
-Odeio essa gente. Fora que são tão intrometidas.
- A minha emprega ouve sertanejo o dia todo.
-A minha quer aumento o tempo todo. Isso é coisa daquele presidente analfabeto.
Stop, please! Que tô sem ar só de relembrar os diálogos. Primeiramente. Porque toda “senhora” da classe média utiliza excessivamente o pronome possessivo” minha/meu” com as trabalhadoras domesticas? Já repararam? Parece coisa de escravocrata: Minha empregada. Minha...minha... Terapia na classe na média, por favor. #gradicidanovamente Ninguém pertence a ninguém. #ficaadica Prestar serviço não significa posse. E trabalho doméstico é digno como qualquer outra trabalho. E a senhora da classe média não é melhor que ninguém para tratar alguém com tanto desprezo, ok? Ah! E o presidente analfabeto – denominado assim pela sua mediocridade -, foi chamado de chefe por um dos maiores músicos e ativistas do mundo. Aqui
Neste momento sentia minha respiração ofegante e começou a me dar palpitação. E ouvi a pior do dia:
- Vc acredita que o filho negrinho da minha empregada estuda na mesma universidade do meu filho?
- Credo! Onde vamos parar.
Essa foi demais para eu me conter. A resposta veio naturalmente. Eu disse:
- Vamos parar num país mais justo, igualitário, onde todos terão as mesmas oportunidades e vocês terão que engolir, porque é daí que nasce a democracia. E racismo é crime inafiançável. Compreendem?(eu disse em tom de ameaça. Confesso!)
Eita! Quando vi já tinha saído da minha boca. Elas me olharam com medo, ignoram-me e não me responderam. Mas percebi que elas odeiam o povão/pobre como eu. A manicure veio me chamar. Percebi que causei mal-estar na sala de espera do salão. Reparei que todas falavam de mim. Neste momento comecei a entender porque o feminismo é um grito solitário, pois há algumas mulheres que gostam da condição medíocre de viver a sombra de um marido ou algo do gênero. E para que conceitos de direitos humanos/civis sejam compreendidos, as pessoas necessitam se livrar da futilidade diária. Amém. Mas...E digo mais, não são só os homens que são machistas. #fatotriste
Quanto a mim. Continuo indo a salões de beleza – mesmo me sentindo uma estrangeira -, mas agora vou na companhia do meu Ipod, o qual me protege de uma sociedade doente e fútil. #melhorremdeio Claro que quero cuidar da minha aparência física. E como já disse aqui: gosto da beleza. Mas ela não é o único assunto do meu repertório e tenho pena de pessoas que só utilizam um mote para sua vida e vomitam preconceitos que adoecem mais a sociedade.
Nota: Eu também tenho meus momentos alienantes. Como todos. Contudo, não deixo me contaminar pela mediocridade coletiva e sei exatamente o que é importante para mim e para minha vida. Conjugo o verbo SER em todas as pessoas, tempos e modos. #ligacao
4 comentários:
De fato, esse tipo de conversa se ouve cada vez menos por aqui, por aqui é Portugal, Lisboa. Mas você tem razão, muitas mulheres se calhar a maioria, sobretudo das que estão «bem casadas» são cumplices amáveis e prazerosas do sistema social que a todas oprime.
Ainda, ser feminista implica muita coragem, implica coragem para afrontar uma cultura em que todas fomos educadas.
Vez enquando, vou ao Twitter falar mal da Classe Média que aprendeu a fazer dinheiro e na mesma medida desaprendeu a ser educado, ser tolerante, ser compreensivo, ser simpático...
São e querem ser reconhecidos como consumidores, sem nenhuma produção de conteúdo próprio, sem uma reflexão própria, pq podem comprar livros de auto-ajuda, sem uma caridade própria pq doam a instituições por transferência bancária, sem contato com os assistidos. Uma classe média que não tem biblioteca em casa, vejo isso no metrô que pego todo dia. (aqui no Rio, o trem liga a periferia ao centro e o metrô as áreas mis abastadas ao centro). Ninguém lê, só eu e algum outro camarada com um desses best-sellers de adolescentes.
E toda vez que vou falar mal deles, fico achando que tenho inveja da fortuna deles, não é isso, pq uma fortuna precisa gerar satisfação imadiata mas também garantir uma velhice confortável. E não me parece que o país vá ter um bom futuro com essa pobreza intelecrual em q se encontra a nossa elite econômica.
Dani, vc é tudo de bom. ri muito deste post, ri mesmo... fiquei imaginando a sua cara e como nos parecemos. como já disse em um texto meu, não me encaixo neste sistema. qdo chego ao meu trabalho pela manhã e todos estão discutindo novela das 8 eu tenho vontade de virar e voltar embora... dá para acreditar... eu é que digo, em que mundo vamos parar com pessoas como essas .....
bj pra ti
Nê
Danizinha, menina da unha feita e da fita de laço na cabeça:
Infelizmente, vivemos numa sociedade machista, como vc mesma mostrou. E cercados num machismo que vem das próprias mulheres muitas vezes. Por isso o partido das penas e dos bicudos continuam a dominar SP, pq tem seus eleitores garantidos.
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