segunda-feira, dezembro 27, 2010

RETROSPECTIVA E HERANÇAS...

Segue abaixo, o brilhante o artigo de Emiliano José – Carta Maior -, o qual me emocionou em muitos parágrafos e me levou a uma reflexão acerca do preconceito velado que permeia nossa sociedade. Tão bem dito pelo autor: “...três séculos de escravidão não pode esperar que o espectro da Casa Grande tenha desaparecido...”

Faço uma retrospectiva da campanha sórdida contra Dilma, a qual foi contra a MULHER ( Emiliando disse bem que a campanha representou a RAIVA contra a mulher), principalmente pelas mulheres de coragem, guerreiras que lutam e que não necessitam estar ao LADO ou a SOMBRA de um macho para sobreviverem, mesmo em meio hostil.

O que mais me indignou foi assistir aos seus adversários, inclusive outra mulher, verbalizando discursos conservadores com o objetivo a qualquer custo de levar a eleição para o segundo turno: contra direitos civis/humanos, contra nordestinos, pobres, homossexuais, discursaram a favor da família/bons costumes (Viva a marcha da moral e da família de 64! Bandeira levantada pelo Sr. Serra. Valha o pastor Malafaia em seus programas de TV. E o seu jingle patético que dizia que Serra era do bem...), contra o aborto (sem se preocupar com a questão da saúde pública e ignorando que o fato acontece diariamente e isso não tem nada a ver com religião e sim com direito a vida/escolha/saúde. Pune-se a mulher, mas e o homem? Quem aborta primeiro? Quem abandona...? Portanto, por que só a mulher responde ao crime hediondo? Questão machista, não? Se é para criminalizar que respondam as duas pessoas que fizeram o filho.), abraçaram-se com as religiões, mas se esqueceram que o estado é LAICO e que a maioria (comprovado pela eleição) o quer assim... E evidenciando a cara de uma parcela da sociedade sexista e segregadora socialmente (é, porque agora tem que dividir espaços que antes era somente de uma elite. Fico tão feliz com isso! Confesso: Adoro ver tudo misturado: pessoas de todas as classes socias/etnias/orientação sexual repartindo os mesmos lugares e tendo acesso à cultura/educação/inclusão econômica e social.

Todos esses fatores motivaram-me a “dar o sangue” na campanha da Dilma. Lembro-me foram três meses sem vida social/pessoal, a rotina era “redes sociais”, respondendo emails preconceituosos/machistas/racistas, reuniões e a luta pelo voto. Votos que conquistei pela net, nas conversas de bares e indo nas casas das pessoas. É... Voltei à base para eleger Dilminha! E me orgulho tanto disso...:) Pois essa mulher é o retrato de tudo que eu quero ser: guerreira, corajosa, forte, justa, sincera, inteligente, sensível e DIGNA. É, agora, nós podemos!



SEGUE O TEXTO:

Heranças atávicas - Emiliano José

A contingência da passagem de ano sempre nos leva a algum tipo de balanço, e o ano de 2010 não será fácil de esquecer. Pelo fato simbólico da eleição de uma mulher para a presidência da República. E pela circunstância de que a assunção dessa mulher à condição de principal protagonista da cena política fez emergir preconceitos atávicos que muitos de nós, quem sabe ingenuamente, imaginávamos sepultados definitivamente.

As mudanças não são fáceis de serem aceitas. E uma mulher na presidência da República no Brasil se, num primeiro momento, poderia parecer um acontecimento quase banal, era um fato novo, muito novo, inédito, e representava quase um novo marco civilizatório. Tão forte que provocou reações que muitos de nós não imaginávamos possível. A eleição do presidente operário em 2002 provocou uma avalanche de preconceitos da elite brasileira, que foram solenemente ignorados pelo nosso povo. Lula termina seu mandato com um recorde de aprovação: 83%.

Dilma foi um tsunami tão forte quanto Lula. E um tsunami que provocou a recuperação, parcial que seja, dos valores de uma sociedade patriarcal, misógina, homofóbica, autoritária e elitista. A parte da sociedade que assumiu esses valores de modo militante recusa conquistas já consagradas pelas sociedades democráticas avançadas. E o fez abraçando-se a religiões, pretendendo que o Estado brasileiro deixasse de ser laico, e se rendesse a princípios que contrariam os avanços da ciência e dos direitos à saúde, e atacando principalmente o direito das mulheres.

Tudo por causa de uma mulher. Tudo contra uma mulher. Tudo tendo um significado político, evidentemente. Mas um significado político que se entrelaça com revelações culturais profundas, a evidenciar que o ovo da serpente do pensamento conservador ultradireitista não desapareceu da cena brasileira. E seria ilusório, creio, imaginar que tivesse desaparecido. Não foi ocasional que a campanha adversária tenha ressuscitado e valorizado até a famosa Tradição, Família e Propriedade (TFP) para afirmar suas posições. Ou que igrejas tenham retornado a posições de 1964.

A raiva contra a mulher ficou manifesta na discussão desonesta sobre o aborto. Como se a questão fosse ser apenas contra ou a favor do aborto, e não a discussão sobre o direito à saúde das mulheres, a assistência às mulheres vítimas de abortos clandestinos, normalmente mulheres pobres. Estima-se que morrem mais de 500 mulheres por ano no Brasil devido aos abortos clandestinos.

E as que não morrem, seriam o caso de colocá-las todas na cadeia?

Impossível. Ora, ora, tudo próprio de uma sociedade hipócrita, farisaica, que não olha para sua própria face. O próprio Serra, como ministro da Saúde, tinha posição mais humana. Mas, na campanha, preferiu abraçar as teses do medievo trevoso, só abrandadas quando foi revelado o aborto feito por sua própria mulher, revelação feita por algumas alunas de Mônica Serra.

As teses contra os homossexuais só perderam força quando perceberam o impacto eleitoral negativo. Mas, como conseqüência disso, temos assistido cenas freqüentes e deploráveis de ataques a homossexuais. A raiva contra os nordestinos, que revisitava o arianismo, surgiu com vigor logo que se revelou a vitória de Dilma. Para que não nos enganemos, o pensamento foi expresso especialmente por uma parcela da nossa juventude.

Não creio que devamos tratar esses acontecimentos como secundários. Nem com raiva. Com indignação, sim, sem dúvida. Mas, também, com a compreensão de que há ainda uma longa marcha para a mudança de mentalidade de nossa sociedade. Quem viveu bem mais de três séculos sob a escravidão não pode esperar que o espectro da Casa Grande tenha desaparecido. Esse espectro, aqui e ali, ressurge, e muitas vezes, com força.

E especialmente quando uma mulher resolve confrontar toda essa cultura, ao se pôr como principal mandatária do País. É verdade que a maioria da sociedade brasileira optou pela continuidade de um projeto transformador. No entanto, a luta por uma nova sociedade, livre de preconceitos, de discriminações, de racismos, continua mais que atual. Feliz 2011.

3 comentários:

Alan Cristhian disse...

Muito bom o artigo e as opiniões constantes no mesmo.
Agora é preparar uma festa de um enorme obrigado ao Lula e votos sinceros de sucesso para a Dilma. A luta continua, sempre!!

Moabe disse...

Ótima reflexão do ano que entrou para a história a vitória da Dilminha. Vencemos o preconceito, ainda que ele continue a existir, vencemos o medo, ainda que tentem nos assombrar e governaremos juntos com Dilma, mesmo na ausêncai do Lula. 2011 será o inicio de um novo tempo, o momento em que todos nós, homens, orgulhosamente seremos governados por uma corajosa mulher.

Anônimo disse...

Senhorita Dani,

Belo comentário sobre o texto.De uma grande mulher para outra. Realmente vocês podem.
Te admiro muito, menina!
Beijos do Júnior