sexta-feira, julho 30, 2010

Deus e o diabo na terra do sol – Glauber e uma vastidão de sensações à busca da liberdade

O sonho por maior liberdade e por melhores condições de vida foi e continua sendo temática de muitos textos fílmicos, os quais fomentam a vontade da mudança e na própria construção da história e das lutas da humanidade. A arte é o processo de reflexo da realidade como dizia Marx.

Revi semana passada Deus e o diabo na terra do sol do magnífico cineasta Glauber Rocha e direcionei todas as minhas atenções, reflexões e emoções para a mais rica criação artística que o homem pode criar: o bom cinema!

Deus e o diabo na terra do sol conta a história do vaqueiro Manuel que, devido à exploração que sofre do coronel Morais e diante da injustiça praticada por este ao não aceitar a partilha dos animais no final do contrato de parceria, mata-o durante as discussões provocadas pela tentativa de acerto que daria ao vaqueiro condições de adquirir seu próprio pedacinho de chão para trabalhar com liberdade e por conta própria. A exploração é um tema muito presente na obra de Glauber, explicitando a influência marxista em suas obras.

Manuel para se proteger de represarias por parte da família do coronel foge com sua mulher Rosa e se juntam no grupo de um beato, chamado de Santo Sebastião, que prometia o final das injustiças sociais e do sofrimento quando o sertão virasse mar e o mar virasse sertão. Porém, os latifundiários e a Igreja católica contratam um matador, conhecido como Antonio das Mortes, para exterminar os seguidores de Santo Sebastião. O jagunço extermina todos e seguidores do beato, deixando vivos, apenas, Rosa e Manuel: para que eles pudessem contar a historia da perseguição.

Dá-se inicio a nova fuga de Manuel e Rosa, que acabam se juntando com Corisco, o diabo loiro que fazia parte de um grupo de cangaceiros. Porém, Antonio das Mortes é contratado, desta vez pelo governo, para eliminar o cangaceiro Corisco. Inicia-se uma implacável perseguição ao grupo que acaba com a morte e decapitação de Corisco pelo pistoleiro e a mais uma fuga de Manuel e Rosa em direção do mar e da esperança de uma vida melhor. Neste filme, Glauber quebra valores maniqueístas e estéticos do cinema, pois uma grande característica do cineasta é a critica à ideologia capitalista do cinema norte-americano, portanto, a ideologia do cinema novo consistia na rejeição dos valores impressos pelo cinema de Hollywood, o qual retratava fantasia apenas, e não a realidade humana. Um filme para ser bem-sucedido nessa visão norte-americana precisava possuir um alto valor comercial, tanto em termos de produção como de divulgação, fazendo esse tipo de cinema não ser considerado arte para Glauber.

Esse filme expressa de uma forma singular que o homem é composto de muitos outros homens, que é dialético por natureza, multifacetado, altamente rico de conhecimento e atividade, e assim, se refletindo à luz de Marx.

Considerado pelos críticos como um dos melhores diretores de cinema no mundo, Glauber soube mostrar que, com boas ideias, mesmo com poucos recursos, é possível fazer cinema de qualidade e que promova a reflexão. Nada mais objetiva, pura e simples a sua célebre frase: Uma idéia na cabeça e uma câmera na mão, sua mais perfeita tradução. Para mim, falar de Glauber é sempre desafiante, pois sei que encontrarei pela frente um turbilhão de emoções, as quais sentirei sempre de forma diferente cada vez que rever sua obra. Entregar-se a Glauber é estar aberto ao novo e ao conhecimento. Assistir Deus e o diabo na terra do sol é instigante para todos que desejam se compreender melhor e principalmente, ao mundo e toda a sua dialética.

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